O Projeto de Lei 1.725/2024 (PL 1.725) tem gerado preocupações sobre a flexibilidade fiscal e o potencial impacto a longo prazo nas finanças públicas. Esse projeto, que propõe novas funções para a Empresa Gestora de Ativos (EMGEA), está sendo analisado no Senado após sua aprovação pela Câmara dos Deputados, e sua proposta principal é transformar a EMGEA em uma securitizadora de créditos imobiliários. A securitização proposta pela EMGEA envolve a compra de créditos imobiliários de instituições financeiras, como a Caixa Econômica Federal, para expandir a oferta de crédito no setor.
A proposta levanta questões sobre os riscos associados, pois a EMGEA assumiria o risco de crédito ao empacotar e vender esses créditos para investidores, sendo que os títulos vendidos podem não estar totalmente vinculados aos créditos imobiliários adquiridos. Assim, se os mutuários não pagarem os financiamentos, os investidores ainda poderão receber o pagamento, deixando o prejuízo para a EMGEA, e, por conseguinte, para o erário público.
Apesar da implementação de medidas para a governança robusta da EMGEA, as operações podem começar antes que essas práticas estejam devidamente estabelecidas, o que levanta preocupações sobre a responsabilidade e os controles regulatórios. Os autores defendem que a EMGEA deveria estar sujeita à supervisão semelhante à das instituições financeiras, incluindo provisões para perdas esperadas e responsabilização dos gestores.
Além disso, o PL 1.725 também prevê benefícios adicionais ao setor imobiliário. Por exemplo, há uma proposta da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC) para que fundos de pensão, incluindo os das estatais, possam voltar a investir em imóveis. Esses fundos poderiam se tornar potenciais compradores dos créditos empacotados pela EMGEA, criando um ciclo onde o risco é transferido para entidades públicas ou controladas pelo Estado.
Outro ponto crítico do PL é o uso do Fundo Clima, operado pelo BNDES, para fornecer hedge cambial a investidores externos. Esse mecanismo permitiria que o erário público absorvesse os riscos cambiais, utilizando derivativos adquiridos pelo Banco Central e repassados a instituições financeiras.
A crescente utilização de recursos parafiscais – ou seja, gastos públicos que não transitam diretamente pelo orçamento federal – é outro destaque da crítica dos autores. Estatais, fundos de investimento público e outras entidades estão sendo utilizadas para financiar projetos sem impactar diretamente o resultado primário, o que pode mascarar a real situação fiscal do país.
Exemplos de práticas recentes incluem o aumento dos desembolsos do BNDES, que devem alcançar 1,3% do PIB em 2024, e o crescimento das operações da Finep, que saltaram de R$ 2,7 bilhões em 2021 para R$ 13,4 bilhões em 2023, financiadas por fundos públicos. Esses fundos, como o Fundo Social e o Fundo da Marinha Mercante, contribuem para o aumento dos recursos parafiscais, descolando o financiamento público do Tesouro Nacional.
Além disso, estatais que recebem recursos do orçamento fiscal parecem estar operando com maior liberdade. Dados do Banco Central mostram que, de janeiro a julho de 2024, as estatais acumularam um déficit de R$ 2,3 bilhões, revertendo o superávit de R$ 7,6 bilhões registrado no mesmo período de 2022.
Os autores também destacam o uso de manobras contábeis para driblar as regras fiscais e questionam o uso de receitas não-recorrentes, como a apropriação de recursos esquecidos em contas correntes, para cumprir metas fiscais. Embora o Banco Central tenha argumentado que essas receitas não deveriam ser contabilizadas como primárias, o governo insistiu em utilizá-las para cumprir a meta de resultado primário.
No contexto mais amplo, o PL 1.725/2024 reflete uma estratégia crescente de flexibilização fiscal por meio de instrumentos parafiscais. A utilização de estatais e fundos públicos para financiar políticas e programas sem transitar pelo orçamento da União abre espaço para a expansão de gastos sem o necessário controle e supervisão. Essa estratégia, segundo os autores, pode comprometer a credibilidade das métricas fiscais centrais, como o resultado primário e o limite ao crescimento dos gastos públicos.
A preocupação central expressa no artigo é que, ao evitar discutir reformas para reduzir as despesas obrigatórias, o governo está optando por contornar as regras fiscais com soluções temporárias e criativas, que podem gerar desequilíbrios financeiros de longo prazo. Os autores sugerem que essa abordagem não é sustentável e poderá resultar em um cenário fiscal ainda mais desafiador nos próximos anos, com impactos sobre o equilíbrio das contas públicas e o crescimento econômico do país.
Em resumo, o PL 1.725/2024 ilustra os desafios e riscos associados ao uso de mecanismos parafiscais para financiar políticas públicas, levantando preocupações sobre a governança, a responsabilidade dos gestores e a sustentabilidade fiscal do Brasil a longo prazo.
Fonte:
OPINIÃO. Os gastos parafiscais estão acelerando. As armadilhas do PL 1.725 www.braziljournal.com @2024. Disponível em: https://braziljournal.com/opiniao-os-gastos-parafiscais-estao-acelerando-e-o-pl-1-725-e-um-cavalo-de-troia/ # Acesso em: 26 set 2024.